In Verbis


icon-doc
REVISTA DE 2012

Contradições e limitações da Justiça

  • PDF

A Justiça tem contradições e limitações que lhe retiram eficácia, nobreza e exemplaridade. A ausência destes princípios nega-lhe o seu papel de pilar estruturante do Estado de Direito. E muitas vezes a Justiça não é eficaz e exemplar.

Mas o que pode fazer um juiz para inverter esse estado de coisas? Em alguns casos, nada. Não tem poderes processuais ou legais suficientes para tornar eficaz o funcionamento dos tribunais, ou para contornar a lei e aplicar uma medida mais pedagógica do que legal, a não ser no caso dos processos de jurisdição voluntária, que são uma gota no oceano dos processos que tramitam nos tribunais. Pode um juiz aplicar a medida de coacção da prisão domiciliária, sob a condição do criminoso mudar de domicílio para que não conviva, por exemplo, com um familiar da pessoa que assassinou? Não. Pode o juiz criminal impedir que uma filha deixe de viver com o pai que assassinou o seu marido, para que este não conviva com a filha desta? Não. Pode um juiz criminal ultrapassar a jurisdição de menores que confiou a guarda da criança à mãe, retirando-lhe direitos? Não.

Então, como se evita este absurdo e triste coincidência de um criminoso conviver com um familiar, que é menor? Como se conjuga a defesa do superior interesse da criança com a medida de coacção aplicada?

Só recorrendo à prisão preventiva do arguido. E se a prisão domiciliária for a medida certa e acautelar todos os pressupostos e finalidades prosseguidos pela prisão preventiva? A única saída, mesmo que seja exagerada e injusta, é a prisão preventiva. Dois regimes jurídicos em confronto, que se atropelam e que não cumprem as finalidades desejadas e queridas pela comunidade.

Não seria curial um sistema normativo mais aberto que desse mais poderes ao juiz, permitindo-lhe condicionar a aplicação desta medida de coacção à obrigação de indicar uma outra residência, sob pena de, não o fazendo, aplicar-se a medida mais gravosa de coacção?

Se a lei conferisse essa margem de manobra ao juiz a Justiça seria mais justa, mais certeira e equilibrada. E evitava situações estranhas, difíceis de serem explicadas, como é "obrigar" uma menor a viver e a conviver com o assassino do seu pai. Nem se assegura o superior interesse da criança, nem se aplica uma medida de coacção ajustada ao caso concreto. Só se salva o superior interesse da criança prendendo o criminoso, o que pode não ser razoável.

E, depois, perante tamanha contradição e limitação, digam que a culpa é do juiz. E não de uma lei estranha que não está adaptada para a vida. A vida é muito mais que uma lei.

Rui Rangel | Correio da Manhã | 16/02/2012

Comentários (4)


Exibir/Esconder comentários
...
"A vida é muito mais que uma lei".
Bom, vou desistir de criticar estes escritos. É já evidente que estamos perante um génio, que não pode ser espartilhado nas pautas redutoras de uma folha de processo, e que naturalmente escorre para os jornais e para a comunidade, para nosso benefício. Bem haja, Dr. Rui Rangel.
Hannibal Lecter , 16 Fevereiro 2012 | url
...
Este artigo tem claramente a ver com a discussão naquele monumento à mediocridade chamado Justiça vesga ou qualquer coisa do género e que eu só costumo ouvir no podcast, pois à 2ª à noite tenho coisas bem melhores para ver como ver uns cromos vermelhos a levarem nas orelhas...

E tem a ver pois o jornaleiro, com o seu baixo nível certamente congénito, andou a bolsar sobre eventuais favores de juizes a familiares de juizes que são arguidos. Pura cloaca!!!

Mas indo ao caso concreto - de que só sei o que se fala na comunicação social -, entendo o seguinte:

1.º A criança não está entregue ao avô, mas sim à mãe, com a qual, ao que parece, reside o avô;
2.º Que se saiba, o avô nunca maltratou a menor e, apesar de ter morto o pai da menor, nada tem a ver com o caso de um tipo qualquer que matasse o pai da menor e com quem a menor fosse obrigada a viver.
3.º De todo o modo, os eventuais danos que possam resultar para a menor poderão - E TERÃO - de ser aferidos por um psicólogo e não por via de atoardas reles.


Ainda quanto ao texto, é evidente que se a OPH fosse adequada do ponto de vista do arguido, se tal fosse nocivo para a criança e o arguido não tivesse outra casa para ir, os direitos da criança teriam dse se sobrepor aos do arguido e este teria de ficar na cadeia. Era o que faltava obrigar a criança a "levar" com o arguido que lhe matou o pai só porque a prisão preventiva fosse excessiva para este. Contudo, não me parece que seja o caso.
Zeka Bumba , 16 Fevereiro 2012
Eih hombre...
?Por qué no te callas?
Priolo , 16 Fevereiro 2012
Base para debate
Seria interessante que se apurasse como são tratadas estas situações lá fora pela Europa, Estados Unidos, Canadá, etc.
Isso permitiria uma análise comparativa e uma visão mais global da questão - haveria, então talvez, uma boa base para debate.
FBC , 18 Fevereiro 2012

Escreva o seu comentário

reduzir | aumentar

busy

Últimos conteúdos

A estrutura da InVerbis está organizada por anos e classificada nos correspondentes directórios.Os conteúdos publicado...

O Estado assumiu, através da empresa pública Parvalorem, a dívida de quase 10 milhões de euros de duas empresas de Vítor...

Dos 118 homicídios cometidos em 2012, 63 tiveram familiares como protagonistas • Cinco pais e 18 padrastos detidos por a...

Pedro Lomba - Na primeira metade do ano o ajustamento negociado com a troika correu dentro do normal e expectável. Mas d...

Últimos comentários

  • Tutela da inveja

    Meu Caro Herr Flick, ouça bem que só vou dizer isto uma vez: nem todos vão para casa ao fim de 9 (não 12) anos. Apenas alguns....

  • Requisitório ao regime

    E houve um zombie(ser do outro mundo) uqe recebeu uma casa na Coelha por metade do seu valor...

  • Condenada por insultar Tribunal de Família

    bla bla bla. o que interessa saber é quem fica a ganhar dinheiro ou impunidade com os processos lentos e sem autoridade. nós sab...

Tradução automática

Opinião Artigos de Opinião Contradições e limitações da Justiça

© InVerbis | 2012 | ISSN 2182-3138 

Sítios do Portal Verbo Jurídico