In Verbis


icon-doc
REVISTA DE 2012

Uma decisão justa

  • PDF

É de aplaudir a decisão do Tribunal de Trabalho de Lisboa que julgou inconstitucionais os cortes salariais. É evidente que a Constituição não permite o confisco de salários sem indemnização, pelo que nenhum governo estaria legitimado a tomar essa medida, a menos que o estado de emergência tivesse sido decretado. Não o tendo sido, compete aos órgãos de soberania defender a Constituição, não estando os mesmos autorizados a suspender a sua aplicação com fundamento em razões de Estado.

Os trabalhadores do sector público perderam nos últimos dois anos 25% do seu rendimento. Hoje sabe-se que tal não vai servir para nada, pois o sagrado défice orçamental de 4,5% em 2012 já vai em 5,4% nos primeiros dias do ano, porque alguém se esqueceu que a receita extraordinária de 2011 implicava aumento da despesa ordinária já em 2012. Ao mesmo tempo que ninguém assume a responsabilidade por essa desastrosa decisão, insiste-se em retirar aos trabalhadores os salários a que têm direito.

Se nem o Presidente da República nem o Tribunal Constitucional defendem a Constituição, ao menos que o façam os tribunais comuns. Esta sentença pode vir a ser revogada pelo Tribunal Constitucional, mas não deixará de fazer história, demonstrando que no nosso país ainda há tribunais que não transigem com violações da lei fundamental.

Luis Menezes Leitão (Professor FDUL) | i-online | 17-01-2012

Comentários (5)


Exibir/Esconder comentários
José Pedro Faria (Jurista)
Excerto do Expresso em linha de 19 de outubro de 2011:

«Cavaco Silva afirmou hoje que a retirada dos subsídios de férias e de Natal aos funcionários públicos e pensionistas constitui uma "violação básica da equidade fiscal" e reiterou que os limites para os sacrifícios que se podem exigir aos cidadãos já poderá ter sido ultrapassado.

"Pelas situações dramáticas que chegam à Presidência da República, receio que em alguns casos, como no dos pensionistas, esse limite pode já ter sido ultrapassado", afirmou aos falar aos jornalistas no final da sua intervenção na abertura do 4º Congresso dos Economistas, que decorre em Lisboa.»
E acrescentou: «precisamos de uma política humana, orientada para as pessoas concretas».
E disse ainda Cavaco Silva que, «tal como os livros ensinam, a redução de vencimentos ou pensões a grupos específicos é um imposto».

Qual o resultado prático desta sábias reflexões presidenciais? Zero.

Tendo em conta as responsabilidades governativas de Cavaco Silva ao longo de tantos anos (recordo a destruição do sector produtivo do país) e esta inconsequência absoluta, escuso-me a produzir outros comentários.
José Pedro Faria (Jurista) , 18 Janeiro 2012
...
"Qual o resultado prático desta sábias reflexões presidenciais?".


Sábias reflexões ou conversa da treta? Eu apostaria mais na 2.ª, pois o pensador promulgou, sem quaisquer pruridos esse mesma lei...
Zeka Bumba , 18 Janeiro 2012
Pergunto ao Sr. Professor
Parte 1

Sr. Professor, respeito a sua opinião, mas, se puder ou quiser (até hoje ninguém me respondeu a esta), diga-me o seguinte:

no caso de um País entrar em recessão, é inconstitucional a baixa de salários a funcionários públicos?
Ou só é inconstitucional se se decretar o estado de emergência? Ou só é inconstitucional se a baixa for feita apenas a funcionários públicos, e se for feita a todos não há inconstitucionalidade? (Salvo, naturalmente, por violação das expectativas constitucionalmente tuteladas, tutela essa que a todos abrange.) E mesmo assim ainda seria necessário decretar o estado de emergência, cumulativamente?

Compreendo que diga que os actuais cortes são inconstitucionais por violação das expectativas constitucionalmente tuteladas ou por violação do princípio da igualdade (cuja invocação, para mim, tem limites; seremos todos realmente iguais quando o departamento público, o instituto público, a faculdade pública puderem falir como pode falir a empresa para a qual trabalho). Mas não concordo com a afirmação de tantos opinadores, uns juristas, outros não, de que qualquer corte, aparentemente por pequeno que fosse, seria sempre inconstitucional.
Eu, se governasse, não faria os cortes que foram aprovados. Mas para cima de certos valores, fá-los-ia até muito, muito maiores, em particular nas pensões. (Lembro a este propósito a pergunta: em que País da UE há reformas de mais de 5000 euros? Tirando a Grécia, claro).
Mas diga-nos: o corte de salários, quando em recessão económica (PIB deste ano inferior ao do ano passado), é sempre inconstitucional? Então será que a nossa Constituição não impõe senão que, quando se entre em recessão, os "direitos adquiridos" (é com todo o respeito que lhe digo que nego categoricamente a existência do conceito subjacente a esta expressão - como se um direito adquirido não pudesse cessar, por revogação da norma que o consagrou... tão simples quanto isso. Como se a cessação da existência de direitos uma vez adquiridos tivesse algo de estranho, no mundo jurídico, e não acontecesse amiúde...) por certa geração tenham de ser mantidos à custa de... (eu ia dizer do trabalho dos mais novos, mas os que trabalham bem estão a emigrar). À custa de quê, Sr. Professor, não tendo nós nem indústria, nem poços de petróleo, nem tecnologia de ponta? Será então à custa de uma falência certa. Onde está a criação de riqueza que poderia sustentar, a uma pessoa da minha família, para lhe dar um exemplo, os 2500 euros por mês de reforma "adquiridos" (para todo o sempre, sob pena de inconstitucionalidade? Será?) depois de apenas 32 anos de serviço ao Estado e com 55 anos de idade? Isto em 2005. (Recebendo mesmo mais estando reformada do que a trabalhar?) Onde está o moto perpetuo para manter este estado de coisas?
Gabriel Órfão Gonçalves , 20 Janeiro 2012
...
Parte 2

Sr. Professor, é por haver reformas de mais de 10 mil euros em Portugal dados a pessoas que "trabalharam" metade do que é normal trabalhar-se que pessoas como o Sr. Professor sofrem cortes.
É por um bilhete de avião para fora não pagar nada de IVA, enquanto uma sopa paga 23%, o mesmo que uma mala de senhora de 2500 euros, como as há à venda na Av. da Liberdade. E com duty free. Enquanto estas situações de lesa-Pátria não forem erradicadas, nada se fará para pôr o País no rumo certo. Este Tribunal pode ter respeitado a Constituição, e um tribunal superior que confirme esta decisão também. Mas nenhuma deles põe as batatinhas no prato a ninguém. Teremos a Constituição, e a barriga - de alguns - vazia.
Muitas pessoas da minha geração emigraram. É o que farei também, em princípio: num Estado em recessão em que não se pode tocar nos "direitos adquiridos" (com todo o respeito, Sr. Professor, isto existe, dogmaticamente? De que se trata? Da categoria de direitos irrevogáveis? Mas essa categoria existe, para além dos direitos humanos abraçados pela CRP e pelas proibições de retroactividade (fisco e crime)? Mas um direito não é sempre revogável, salvo se a revogabilidade ofender princípios constitucionais? Tirar 15% a quem ganha 4000 euros / mês ofende mesmo a tutela constitucional das expectativas? Lá que ofenda expectativas, de acordo...), os mais novos não adquirem direitos nenhuns.

Em várias empresas que conheço bem os mais novos chegam a ser contratados a 1/3 do salário dos mais velhos com a mesma função. Dizem que é por os mais novos terem mais experiência. Como eu gostava que me dissessem que é por serem mais produtivos! Não! É por as normas não permitirem, ao empregador, um diminuição unilateral da remuneração. E para o Sr. Professor o Estado também está proibido de o fazer. Os mais novos que carreguem, então!

E por último: quando é que o trabalhador adquire o direito à reforma, com todo o seu conteúdo?:
- quando começa a trabalhar;
- quando se reforma;
- tem que se fazer um misto de regimes (ideia que creio não lembrará a ninguém, mas algo próxima do que já foi sugerido, há muito tempo, a propósito do Direito Transitório das normas do Direito do Trabalho, que, segundo certa perspectiva sindical, fazia o trabalhador acumular sempre direitos antigos das normas velhas com os direitos modernos das normas novas - já que estas, dizia-se, podiam acrescentar novas regalias, mas não revogar direitos adquiridos);
- o direito à reforma está susceptível a permanente intervenção normativa, com os limites da Constituição, mas cujo conteúdo (o dos limites da CRP) não pode equivaler a dizer-se: "uma vez adquiridos, são intocáveis" (é a minha posição).

Muito grato, e também ao auditório da Revista InVerbis, e ao seu Administrador, a quem penhorada e perenemente agradeço este espaço de salutar troca de ideias.
A todos um óptimo 2012 cheio de Saúde!

GOG
lic. FDUL
doutorando FDUNL
Gabriel Órfão Gonçalves , 20 Janeiro 2012
Correcção
Do que acima escrevi, fica a impressão de que Menezes Leitão teria utilizado a expressão "direitos adquiridos". É erro meu (resultado de estar a ler noutra janela desta mesma Revsita Jurídica um texto que utilizava recorrentemente a expressão). Tal expressão não consta do texto do Autor. Menezes Leitão escreve apenas «...retirar aos trabalhadores os salários a que têm direito» A pressa, da minha parte, de criticar a expressão "direitos adquiridos", e de quem a utiliza, deu neste lapso perfeitamente evitável. Fica o pedido de desculpas ao Autor. (A crítica à expressão "direitos adquiridos", e a quem a emprega - não é o caso do Prof. de Direito em causa, como negligentemente supus - naturalmente, mantém-se.)

(Vai em sublinhado porque entendo que uma correcção destas, tendo em conta que imputei a alguém algo que a pessoa não disse, deve estar em destaque para chamar a atenção.)
Gabriel Órfão Gonçalves , 28 Janeiro 2012

Escreva o seu comentário

reduzir | aumentar

busy

Últimos conteúdos

A estrutura da InVerbis está organizada por anos e classificada nos correspondentes directórios.Os conteúdos publicado...

O Estado assumiu, através da empresa pública Parvalorem, a dívida de quase 10 milhões de euros de duas empresas de Vítor...

Dos 118 homicídios cometidos em 2012, 63 tiveram familiares como protagonistas • Cinco pais e 18 padrastos detidos por a...

Pedro Lomba - Na primeira metade do ano o ajustamento negociado com a troika correu dentro do normal e expectável. Mas d...

Últimos comentários

  • Tutela da inveja

    Meu Caro Herr Flick, ouça bem que só vou dizer isto uma vez: nem todos vão para casa ao fim de 9 (não 12) anos. Apenas alguns....

  • Requisitório ao regime

    E houve um zombie(ser do outro mundo) uqe recebeu uma casa na Coelha por metade do seu valor...

  • Condenada por insultar Tribunal de Família

    bla bla bla. o que interessa saber é quem fica a ganhar dinheiro ou impunidade com os processos lentos e sem autoridade. nós sab...

Tradução automática

Opinião Artigos de Opinião Uma decisão justa

© InVerbis | 2012 | ISSN 2182-3138 

Sítios do Portal Verbo Jurídico