Que os sinais de riqueza andam por aí, andam. Em tempo de tanta austeridade, ainda se tornam mais evidentes. E alguns deles são muito misteriosos. Todos nós conhecemos, aqui e ali, um caso destes e opinamos, sem grande pudor, sobre a origem da abastança do vizinho ou do conhecido.
A ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, e o PSD quiseram criminalizar há alguns meses esses sinais exteriores de riqueza, sem causa aparente, vulgo "enriquecimento ilícito". Convenceram o CDS a subscrever um projeto de lei nesse sentido, tiveram um quase inaudito apoio do PCP e do BE na hora de o aprovar, mas esbarraram no PS, no Presidente da República e no Tribunal Constitucional. Em 2013, os sociais-democratas voltam à carga com novo projeto, mas é difícil descortinar - o CDS assume essa própria dúvida - como será possível agora conseguir respeitar a "presunção da inocência" como determina a Constituição da República Portuguesa. Ou seja, como criminalizar a "ostentação" sem parecer inverter o ónus da prova, um pilar fundamental do quadro jurídico de uma democracia. Ou o mesmo que dizer obrigar os cidadãos nestas circunstâncias a provar que os seus bens foram adquiridos por meios lícitos e não o contrário, os tribunais a provar que o foram de forma ilícita.
O PSD pode deixar pelo caminho o CDS neste combate, e ignorar olimpicamente as objeções do PS. Mas terá de ser muito habilidoso, mas mesmo muito, depois de Cavaco ter considerado que o anterior diploma poderia pôr em causa "os princípios essenciais do Estado democrático" e de o Tribunal Constitucional ter validado esta suspeita do Presidente Cavaco Silva. Os cidadãos anónimos são livres de especular sobre a riqueza alheia, os responsáveis políticos não podem dar margem para que esse exercício se transforme numa caça às bruxas. Daí que se esta iniciativa parece recolher vasto apoio da opinião pública, também tem de ser afinada para garantir que a justiça sai a ganhar com a sua aprovação e assim nem Belém nem o Tribunal Constitucional terão argumentos contra.
Editorial | Diário de Notícias | 09-12-2012
Comentários (6)
Exibir/Esconder comentários