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REVISTA DE 2012

Como Cavaco "anestesia" os portugueses

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Cavaco, com um discurso anestesiante, ensaia a justificação do injustificável - a promulgação do OE/2012, sem recurso a fiscalização preventiva do Tribunal Constitucional. Durante a discussão do orçamento, o Presidente da República mostrou-se indignado com a iniquidade perpetrada pelo Governo em matéria de repartição de sacrifícios.  

Não tendo sido ouvido, supunha-se que viesse a assumir um dos seus mais importantes deveres, cumprir e fazer cumprir a Constituição. Digo isto porque não é por acaso que foi estabelecido um juramento de posse que obriga o Presidente a assumir, sem reservas, o compromisso que passo a citar: "Juro por minha honra desempenhar fielmente as funções em que fico investido e defender, cumprir e fazer cumprir a Constituição da República Portuguesa".  Deixar os portugueses intuir a ideia de que haveria medidas no OE que violam a Constituição e nada fazer para esclarecer as suspeitas confessadas, no mínimo, é incumprir com os seus deveres e, mais grave, defraudar o povo que o elegeu.  
 
Vejamos o discurso de início do ano, de Cavaco. Nele, afirma que em "2012 se irão exigir grandes sacrifícios ao comum dos Portugueses e que as dificuldades se farão sentir de forma mais acentuada no dia-a-dia das nossas famílias".  
 
Primeira interrogação: não deveria o PR ter repetido que é inaceitável, por iníquo e incompreensível, que só as famílias dos funcionários públicos e reformados/pensionistas estejam condenadas a suportar o sacrifício e a perda de dois meses de salário?  Para embalar o povo, Cavaco mistura tudo e diz-se preocupado com os desempregados, os mais idosos, os reformados, os pequenos empresários, as crianças e também com a ansiedade de milhares de jovens! Não resolve nada, mas fica bem no discurso.  Mais adiante e para anestesiar os portugueses, refere que "Portugal não pode deixar de cumprir os objectivos fixados no Programa de Assistência Financeira que subscreveu. 
 
Segunda interrogação: não deveria ter dito que os objectivos fixados no referido programa financeiro foram largamente ultrapassados pelo Governo do seu partido e que a maioria do povo será condenada à pobreza e convidada a emigrar?  Na sua conversa de "embalar" lê-se ainda que "a resolução dos desafios que Portugal enfrenta exige, além do rigor orçamental, uma agenda orientada para o crescimento da economia e para o emprego".  
 
Terceira interrogação: apesar de estarmos de acordo sobre as necessidades, não esquecemos que o Governo nada faz para fazer crescer a economia e o emprego e que o seu papel é o de mero cobrador de impostos e de facilitador das ambições dos capitalistas mais exacerbados e desumanos?  Desregular, precarizar, desumanizar e empobrecer é o caminho escolhido pela dupla Passos Coelho/Paulo Portas e, por mais que o Presidente da República diga que não é possível construir o que quer que seja, recorrendo apenas à disciplina orçamental e às sanções, a verdade é que vai deixando o Governo fazer o que quer, sendo, por isso, conivente com uma política que despreza o crescimento económico e a criação de emprego. Mas, no seu discurso de ano novo, o Presidente verbaliza: "… tenho sublinhado a importância da repartição equitativa dos sacrifícios (…), do apoio aos mais carenciados desprotegidos, do diálogo entre Governo e a oposição e do aprofundamento da concertação social."  
 
Quarta interrogação: o que faz o Governo? O contrário do que Cavaco diz ser necessário! Confunde concertação com imposição; repartição com discriminação; apoio com corte/ exclusão. E como reage o Presidente? Repete a necessidade de fazer diferente, mas quando pode afrontar a situação, faz o que o Governo quer e diz-nos que disse que era forçoso seguir outro caminho.  Perante tão dramático quadro, é legítimo perguntar: o que terá Cavaco Silva para dizer sobre a destruição do equilíbrio das relações de trabalho; a intenção de privatização da Segurança Social; o fim do Serviço Nacional de Saúde, ou o desinvestimento na educação? Por mim, estou esclarecido. O Presidente nada faz para defender os portugueses da sanha neoliberal do PSD/PP.  
 
Ora, se um Presidente da República não assume os seus deveres, cresce a responsabilidade dos deputados e, convenhamos, só fica uma alternativa, suprir as debilidades políticas do Presidente e requerer ao Tribunal Constitucional a fiscalização sucessiva do instrumento com maior influência na vida dos portugueses, o Orçamento do Estado.  Assim sendo, e caso venha a concretizar-se uma acção de fiscalização da constitucionalidade do OE/1012, deixo o meu reconhecimento aos deputados que venham a exercê-la e a assumir os poderes que a Constituição lhes confere. E, se forem os do meu partido, aumenta a minha satisfação.

Artur Penedos | Público | 19-01-2012

Comentários (6)


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José Pedro Faria (Jurista) - Quase perfeito
Artigo quase perfeito e que merece o meu aplauso.

Disse quase perfeito porque faltou referir a responsabilidade de Cavaco Silva na atual situação do País.

Cavaco Silva, enquanto primeiro-ministro, colaborou na destruição da nossa capacidade produtiva, sempre caminhando ao lado dos mais poderosos, designadamente no que respeita à política internacional.

Cavaco Silva sempre adotou uma política de submissão ao estrangeiro, que nos deixa hoje de mão estendida, completamente dependentes da "bondade" europeia - "bondade" essa que nos custará, só em juros, 34.400 milhões de euros. Isto será, de facto, ajudar? Ou será antes ajudar, sim, mas a enterrar este pobre país?
José Pedro Faria (Jurista) , 19 Janeiro 2012
A BANHOS...

Será que a Constituição da República Portuguesa foi a banhos?!...
Santiago , 19 Janeiro 2012 | url
Quando vem do Gaspar o próximo "dízimo"?
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Com a economia e a concertação social a correr tão bem não deve tardar nada pois o estatuto do "bom aluno" tem responsabilidades!
A não ser que arranjem um dos muitos peritos terceiro-mundistas que expliquem aos banqueiros(que somos nós em parte,através dos "investimentos") para "perdoarem a dívida" pois somos o mais africano país da Europa...
Lusitânea , 20 Janeiro 2012 | url
...
Ainda hoje foi discutido a nivel de bastidores varios relatorios sobre a saida de Portugal e Grecia fora do euro e alguns bem pensantes continuam a falar da inconstitucionalidade de certas medidas como se houvesse uma obrigação natural do contribuinte europeu em ter de sustentar situações irrealistas.
Melhor seria pensar na situação de tesouraria e nas reformas estruturais da administração publica e justiça para que houvesse confiança no sistema e o País deixe de ter a classificação de lixo.
O valor do titulo executivo da inconstitucionalidade apenas terá validade dentro do rectangulo Portugues mas vale zero a partir de Badajoz para cima(quanto à sua eficacia e face à caixa de tesouraria nem no rectangulo).
woic , 20 Janeiro 2012
...
Cavaco Silva é, sem dúvida, o pior presidente da república de sempre (não podiamos estar pior servidos)...E confesso que, comparado com o que o antecedeu (que até foi atestar a grande estatura moral de arguidos da Face Oculta...), é uma marca bem difícil de atingir. Bem precisávamos de um presidente com a estatura moral do Gen. (e não Marechal, sendo que o porquê disso só o enobrecesse embora bem o merecesse) Ramalho Eanes.
Zeka Bumba , 20 Janeiro 2012
PERMUTA!
O povo tem (o banco) uma casa que vale agora uns 80 mil e agradece (troca por troca) uma casa em condomínio fechado(*/- 1 milhão de €). Não quero pagar IMI's ,Escrituras...etc...)
Quero vizinhos nobres que só tenham gamado o POVO! Os chamados heróis)
É que estou farto de ser gamado....Quando me vão deixar gamar Tambem??? Vá lá sejam solidários!
povo , 28 Janeiro 2012 | url

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